O óbvio repetido é o medo velado
Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal do Brasil. Nas mãos dele está Constituição Federal, a Carta que direciona toda nossa legislação, disciplina a convivência dos cidadãos brasileiros, promulgada em 1988. Com esse documento em mãos, o chefe do Poder Judiciário do Brasil não deu uma entrevista, fez apenas uma declaração após votar em Brasília. E não falou nada mais do que o óbvio:
“É importante lembrar que o futuro presidente terá como seu primeiro ato jurar a Constituição. É importante que se cumpra o artigo terceiro da Constituição, que diz o que constitui os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Primeiro: construir uma sociedade livre, justa e solidária. Segundo: garantir o desenvolvimento nacional. Terceiro: erradicar a pobreza, a marginalização, e reduzir as desigualdades sociais e regionais”
Belas palavras, não? Mas é o óbvio ululante num país democrático. Então, por que ele precisou fazer isso? Porque ele sabe que ele, a instituição que ele preside e o documento que tem em mãos estão sob ameaça. E se ele, como guardião da Constituição, sente cheiro de ameaça, não fala abertamente, quem vai falar? Num País fragmentado como o nosso, em que os porões do whatsapp fazem pessoas acreditarem em Comunismo, cartilha gay, nazismo de esquerda e outras barbaridades que em outros tempos seriam motivo de piada, o recado precisa ser claro, como foi o do ex-colega de Toffoli, Joaquim Barbosa.
Ressalte-se que esse discurso óbvio não foi privilégio de Toffoli, tão pouco só veio à luz do dia hoje. Durante toda campanha, intensificando-se no segundo turno, vários representantes de instituições que inserem-se diretamente na base da democracia vieram a público repetir: “As instituições estão funcionando normalmente”. Essa, por exemplo, saiu da ministra do STF e presidente do TSE, Rosa Weber, ao rebater uma ameaça de um dos filhos do candidato Jair Bolsonaro (PSL), de que bastaria um cabo e um soldado para fechar o Supremo.
Não, ministra, elas não estão funcionando normalmente. Elas estão com medo. Com tanto medo que repetem o mantra do funcionamento e repetem o óbvio funcionamento de uma democracia numa tentativa de enganar a si mesmo. Talvez a sociedade não saiba, por definição, o funcionamento de cada um desses pilares da democracia — e não deve saber mesmo porque isso não se debate no whatsapp — , mas ela sente quando o funcionamento vai dentro dos padrões. É algo que precisa muito mais ser sentido do que visto. Por isso, repetir esses mantras só mostra que algo não vai bem.